O que é o «decrescimento»?

É um conceito que tem vindo a afirmar-se desde os anos 1970, quando alguns autores – incluindo certos economistas reflexivos – começaram a compreender que o crescimento nunca poderia ser infinito. O conceito parte da constatação de que o crescimento, passado um certo limite, traz mais malefícios do que benefícios à humanidade e ao planeta. Desnecessário será dizer que os governos e a grande maioria dos economistas não compreenderam o conceito ou apressaram-se a denegri-lo. Não havendo embora uma doutrina unificada em torno do decrescimento, todos os decrescentistas se reconhecem na frase «num mundo finito não pode haver crescimento infinito». Na visão da RpD, ele propõe uma profunda revisão dos indicadores de riqueza económica, a substituição de indicadores como o PIB, o questionamento do papel social do trabalho assalariado, a oposição ao poder veiculado pela publicidade e a resistência à modelação da sociedade e da economia pela tecnologia. Com o agravamento da crise ecológica, a presença crítica do decrescimento tem vindo a afirmar-se e a incorporar questões como o localismo, a economia solidária, os comuns, a bioeconomia, as baixas tecnologias (low-tech). Alguns continuam a confundir «decrescimento» com «economia sustentável»: os decrescentistas criticam o uso a torto e a direito do «sustentável», muito frequente na boca de políticos, industriais e investidores assustados, considerando que se trata de uma impostura querendo fazer crer que alguma coisa muda no reino do crescimento.

Um movimento que advoga o decrescimento? Porquê?

A Rede para o Decrescimento propõe que a nossa sociedade integre o decrescimento como uma das suas dinâmicas possíveis. O decrescimento é sempre possível pelas más razões – crise económica e financeira, desastre natural, conflitos –, mas quase nunca é tomado em consideração quando se trata de desenhar (e portanto escolher) as práticas sociais e económicas que visam resolver os problemas com que nos confrontamos. Propomos o decrescimento, não como um programa fechado, mas como um solo fértil de ideias e formas de vida. Propomos o decrescimento voluntário, que não partilha as características do decrescimento involuntário ou imposto às populações. O decrescimento não significa sempre menos recursos, dinheiro ou bens: pode acontecer que estes decresçam voluntariamente num aspeto e cresçam de um modo desejado noutro. Significa, em muitos casos, diferentes usos e opções diante dos recursos de que uma sociedade dispõe e mais disponibilidade de recursos perecíveis, assim como mais maneiras (que não apenas a do crescimento) de nos organizarmos de um modo convivial, ecológico e satisfatório para todos. Em suma, o decrescimento corresponde a mais possibilidades de vivermos com plenitude o presente e o futuro.

O decrescimento quer o poder?

Não. Não queremos tomar o poder ou «governar» para impor o decrescimento. Já dissemos que o decrescimento imposto é a inversão do que nos move. Há uma razão muito simples na base dessa afirmação: o decrescimento voluntário implica uma tomada de consciência que acontece, por definição, na pequena escala do indivíduo e do grupo de afinidade. A vida política atual apoia-se num espectro de opções muito restrito, onde as escolhas estão quase sempre pré-definidas e dependem da «sacralidade» do crescimento. Pelo contrário, pensamos que é necessário contestar os poderes dos decisores económicos, publicitários, tecnológicos e sociais, que muitas vezes detêm mais poder do que os decisores políticos. O decrescimento começa aqui e agora, por todo o lado, das formas mais diversas. Isto não significa que não possam existir decrescentistas que participem em eleições se, numa dada circunstância, esse percurso se revelar pertinente. Acreditamos que a vida numa sociedade que integre plenamente o decrescimento acarretará novas formas de representação e de participação política.

Falam de decrescimento individual e colectivo? Há alguma diferença?

Sim, há diferenças. O decrescimento não é um movimento monolítico, como o foram as ideologias do século XX, nem segue a religião global do nosso tempo: o crescimento a todo o custo e apenas assente na disponibilidade de fontes energéticas intensivas e de novas tecnologias. Estas são «razões» sem razão do crescimento: não obedeceram a escolhas nossas e uniformizam a sociedade. O decrescimento pretende dar espaço às diferentes dimensões das nossas vidas. As suas lógicas não têm de ser as mesmas, antes deverão autonomizar-se na medida do possível.

O plano individual: por meio da simplicidade voluntária, da busca de novas formas de vida ou da reconversão daquela que já tem, assim como da recusa dos desperdícios, o indivíduo procura viver em coerência com a sua objeção ao modo de vida dominante, diminuindo a sua pegada ecológica e implicando-se na economia social e solidária. Não há uma maneira «obrigatória» de decrescer: cada um faz o que pode em função das suas condições de vida. Neste plano, não estão em causa apenas os fatores materiais: também a cultura e a forma como imaginamos a nossa existência têm grande importância. Como lhe chamou Serge Latouche, é preciso «descolonizar o imaginário» para decrescer.

O plano colectivo: a consideração do decrescimento abre caminho a muitas possibilidades aos níveis das coletividades de pessoas afins, de simples vizinhos, de localidade ou cidade, assim como nos planos regional, nacional e internacional. Decrescer significa encontrar maneiras diferentes de vivermos uns com os outros. Como as sociedades não vão escolher o decrescimento de um dia para o outro, as práticas coletivas de decrescimento permitem fornecer «exemplos» à sociedade e experimentar os melhores caminhos para uma existência pacífica e satisfatória. Por outro lado, o plano coletivo é aquele onde se colocam as questões políticas e organizacionais dos modos como produzimos e consumimos, podendo existir modelos de decrescimento que passem do plano local e colectivo a escalas públicas mais amplas e diversas.

Uma bibliografia introdutória

Anualmente, instala-se uma euforia no ar em Portugal: a euforia da Web Summit. É um acontecimento litúrgico, um ritual optimista, um regresso à crença no futuro.

Do Crescimento ao Decrescimento

Anualmente, instala-se uma euforia no ar em Portugal: a euforia da Web Summit. É um acontecimento litúrgico, um ritual optimista, um regresso à crença no futuro.

Uma biblioteca do decrescimento

Em construção